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A mostrar mensagens de maio, 2015

meu jardim de hortelã… quem me dera

quem me dera ser só olhos para te ter nos meus sonhos sem adormecer quem me dera ser só escuta seres pela manhã o mais doce despertar quem me dera ser só lábios saciar-me de ti     da água do beijo que brota da tua boca quem me dera ser só abraços ser corpo sem ser gente aninhar-te em meus ramos quem me dera ser só cheiro plantar-te no meu jardim e cheirar-te de manhã nuno campos monteiro 30.V.2015 

restos de um poema inútil

já não me seduz mais caminhar por mortos neste teatro vazio as palavras estão gastas – como disse o poeta – gastas como as sandália de couro cru nos meus pés cansados de percorrer essas calhas e becos que não me levam já a lado algum deixei para trás as esquinas que carregava comigo heranças de madrugadas inúteis esqueci mulher que me esperava com um sorriso e um pôr-de-sol nas mãos muito branquinhas como uma manhã de lençóis de linho o meu navio naufragou e só eu sobrevivi e não sinto nenhuma necessidade do poema nem preciso de sorrisos enviados em garrafas por pessoas que     na verdade     não conheço não ancorei no porto desejado porque não quis decifrar o norte traí a bússola que julgava existir nas palmas das tuas mãos e conheci a intimidade do mar     a astúcia dos ventos que me enganaram nuno campos monteiro 18.V.2015 

ricardo

ele tem ar de poucos amigos olhar fechado e sisudo anda no gamanço – todos o sabem não veste gant nem armani – isso é para maricas fato de treino dos ultra dragões cinza comprado na feira aos ciganos que sempre sai mais barato     isso sim tem brinco no nariz     alargador na orelha nos braços     com cores vivas tatuagens de caveiras     serpentes     facas uma cruz suástica e um cristo usa o boné pousado na cabeça com a pala virada a sudoeste correntes a sair dos bolsos  e pendurados ao pescoço  sentou-se no banco da paragem     sempre com os pés em cima da base espera que algo aconteça     ou a chegada de alguém qualquer um diria que espera os seus amigos insurretos para destruir ou roubar outros dirão que espera pelo agarrado que lhe compra farinha enganam-se todos hoje     não saiu de casa para roubar destruir ou traficar droga veio esperar a namorada que carrega o filho de ambos e que chegará     se o autocarro não se atrasar no próximo 204

só tenho de meu os restos de nós

alguém me encontrou e  também me perdeu numa qualquer rua do desencontro e desengano já não sou eu perdido em ti já só sou isto que sou agora homem-farrapo de dor e solidão que se agita na desventura nos ventos do engano o meu rasto revela-me o rosto dos caminhos da ternura percorridos por nós noutra vida hoje esperam-me barcas de nada palavras falsas cheias de amor em copos de vinho um travo de fel amargo de ingratidão sonhos perdidos     queixumes e quimeras um rosário negro de penas e por castigo tudo verdade nuno campos monteiro 07.V.2015

não me odeies – peço-te

não me odeies – peço-te pelos filhos que não tivemos pela casa que não construímos pela vida que celebrámos pela história que não vivemos pelos filmes que não vimos pelos livros que não lemos pelos poemas que não escrevemos pela música que não tocámos pelos copos que não bebemos pelos jantares a que não fomos pelo amor que não fizemos - por tudo aquilo que não fomos nuno campos monteiro 14.V.2015